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Título: Como Funciona a Ficção
Autor: James Wood
Editora: Sesi-Sp
Tradução: Denise Bottmann
Páginas: 232
“Notabilizado por seus ensaios na revista The New Yorker e professor de crítica literária na Universidade de Harvard, Wood aborda, numa prosa inteligente e aguçada, os mecanismos, procedimentos e efeitos da construção narrativa. A representação do real na literatura é o eixo central de Wood, que questiona os limites entre artifício e verossimilhança na ficção. Em dez capítulos, elementos fundamentais do texto ficcional são discutidos pelo autor: o personagem, o foco narrativo, o estilo. A partir de vasto e diversificado repertório literário – de Henry James e Flaubert, de Tchékhov e Nabókov a Beatrix Potter e John le Carré –, este livro perspicaz e cheio de achados , nas palavras de Milton Hatoum, traz análises reveladoras e acessíveis mesmo àqueles que desconhecem os rudimentos da crítica literária. Referência fundamental para escritores em formação, professores de literatura, e todos que se interessam pelo mundo das letras.”
Garimpando na internet um bom livro sobre estudo literário me deparo com diversas indicações entusiasmadas para conhecer Como Funciona a Ficção, de James Wood. Ao que parece, oficinas literárias nunca deixam de citar este material de apoio aos seus escritores entusiastas. E, seja pelo desejo de se tornar um escritor ou o estudo com o intuito de se tornar um leitor melhor, esta é sim uma indicação incrível.

Primeiro vamos ressaltar sobre a narração deliciosa no decorrer destas páginas. É importante pesquisar dentro do gênero para não acabar com algo além do que você consegue dar conta, em mãos. O texto aqui é muito acessível ao leitor não tão experiente e com menos bagagem literária. Repleto de exemplificações detalhadas, não nos deixa perdidos nas exposições pelo excesso de jargões acadêmicos, partindo do pressuposto que já somos introduzidos no estudo literário. 

Os capítulos são divididos em elementos que compõe um livro como Narração, Personagens, Linguagem, Diálogo, embora também enfoque explanações sobre história da literatura, estilo autoral (como no capítulo Breve História da Consciência, em que James Wood nos conta sobre as três camadas motivacionais que Dostoiévski se utiliza para expor suas personagens) e um franco debate sobre o que é uma genuína criação criativa ou apenas regras enxertadas que limitam a evolução da escrita.

O primeiro capítulo, por exemplo, intitulado Narrando me conquistou para o restante da leitura por trazer uma ideia interessante sobre as narrativas em primeira ou terceira pessoa. Nesta parte, o autor nos instiga a pensar diferente do convencional sobre o pobre narrador em primeira pessoa, o eterno não confiável.
“Na verdade, a narração em primeira pessoa costuma ser mais confiável que não confiável, e a narração “onisciente” na terceira pessoa costuma ser mais parcial que onisciente.
[…] a narração onisciente poucas vezes é tão onisciente quanto parece. Para começar, o estilo do autor em geral tende a fazer onisciência da terceira pessoa parecer parcial ou tendenciosa.” 
Os capítulos que se seguem reforçando sobre narração nos contam como a narrativa moderna nasceu com Gustave Flaubert e o discurso indireto livre, quando o autor parou de se fazer notar em seus textos e começou a agir silenciosamente, disfarçando-se por um mero espectador imparcial. 

Mais adiante continuamos descobrindo como ser prolixo pode tornar o escritor sem objetividade ao passo que ser exato, muitas vezes, transparece confiança na cena que você quer que seus leitores imaginem. Ele nos dá os caminhos para avaliarmos cuidadosamente o que é realmente importante ou vazio ao analisar como críticos um acontecimento narrado. 

O parágrafo inicial do capítulo Personagens começa nos fazendo dar um sorrisinho entristecido ao relembrar todas as horas desperdiçadas com páginas de exatamente isto:
“O mais difícil é a criação do personagem de ficção. Digo isso devido ao número de romances de escritores novatos que começam com descrições que parecem fotografias. […] ‘minha mãe aperta os olhos sob a luz forte do sol e, por algum motivo, segura um faisão morto. Está com botas antigas de amarrar e luvas brancas. Tem um ar absolutamente infeliz. Meu pai, porém, está à vontade, extrovertido como sempre, vestindo aquele chapéu de veludo cinza de Praga do qual lembro tão bem de minha infância’. O romancista inexperiente se prende ao estático, porque é muito mais fácil de descrever do que o móvel: o difícil é tirar as pessoas desses amálgama estagnado e movimentá-las numa cena. Quando deparo uma écfrase extensa como a da paródia acima, me preocupo, imaginando o romancista agarrado a um corrimão, com medo de se soltar”.
O capítulo Empatia e complexidade é curto, mas se torna essencial quando nos faz refletir sobre nossas motivações para ler. Antes de escrevermos, nós temos que ser leitores bons, não? Ao menos sempre pensei assim, esta é uma forma de evoluir, e James Wood endossa sobre o que é a experiência desta atividade ao opinar:
“Lemos literatura porque ela nos agrada, nos comove, é bonita, e assim por diante – porque é viva e nós estamos vivos. É divertido ver a biologia evolucionista girando em círculos quando tenta responder a pergunta: ‘Por que os seres humanos gastam tanto tempo lendo literatura, se isso não traz nenhum proveito óbvio para a evolução?’. As respostas tendem a ser utilitárias – lemos para conhecer melhor nossos iguais, e isso tem uma utilidade darwiniana […]”.  
Em Diálogo, entendemos os vários tipos desta ferramenta na escrita. Alguns autores precisam de grandes explicações completando seus diálogos, outros acham que isso é possível e mais impactante sem muitos rodeios, enquanto determinadas cenas podem traduzir magistralmente a mensagem a que se propõe sem nenhuma fala, como se somente uma câmera solitária estivesse registrando a cena de longe para, posteriormente, ser reproduzida - e compreendida - sem a necessidade do som. 

Concluindo, Como Funciona a Ficção, que carrega desenhos de roldanas em sua capa, contracapa e dentro das páginas, nos deixa com esta mesma sensação: a criação literária é um amontoado de engrenagens que quando postas do modo correto e na direção certa, fazem o sistema todo funcionar corretamente. Ou seja, produzem um bom livro!

Nota 5/5

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